Cringe é a última palavra em matéria de novas palavras. Fez tanto sucesso, foi tão falada que já deu no saco e já ficou até velha.
Nos tempos de hoje acontece tanta coisa, que novas palavras são necessárias a cada instante. Vão aí algumas sugestões de novas palavras para o uso cotidiano:
CPIHHHH – Quando a CPI começa a dar merda.
GENOSUICIDA – O cara que aposta no negacionismo e acaba se dando mal por conta disso.
DEPOMENTE – O cara que vai depor na CPI e mente direto.
AIP- ALMOST IMPORTANT PERSON – Aquelas pessoas que querem se aproveitar de algum evento especial para ficar importantes, mas só conseguem andar meio caminho.
CELEBRIMALAS INSTANTÂNEAS – ex-BBBs, modelos e atrizes, ex-galera de Malhação, etc…
COVA-SIM – A vacina preferida do presidente.
INFLAFLUENCIADOR DIGITAL – O cara que joga em um dos lados do Fla x Flu das discussões políticas.
CRONJE – O conje que é cringe.
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MEMÓRIAS – A CAMPANHA DO MACACO TIÃO
Em 1988 viramos redatores da TV Pirata em tempo integral. Talvez as pessoas tenham estranhado o programa no início, ele era diferente dos programas de humor anteriores. Nunca um programa de humor havia prescindido da claque, aquelas risadas depois da piada. E não havia um astro central, mas uma trupe que se revezava nos esquetes. Por suas inovações, havia um risco de o TV Pirata não ser aceito pelo público, mas não foi o que aconteceu. Ele segurou bem o IBOPE, a medida de todas as coisas na Tv aberta.
O ano de 1988 foi, portanto, um ano em que muita coisa mudou. Além de sair da vida de engenheiro para virar redator na Tv Globo, ainda fizemos um show que foi sucesso e a revista se solidificou, vendendo bastante. E no segundo semestre, mais um evento: a campanha do Macaco Tião.
Tudo começou quando o Jardim Zoológico do Rio resolveu criar uma campanha para melhorar as finanças. Ofereceu o patrocínio dos animais às empresas. Assim a Shell logo “adotou” o tigre, que era símbolo da empresa, o Mate Leão fez o mesmo com o leão, e outras mais. Mas o animal que mais fazia sucesso no Zoo era o Macaco Tião, um chimpanzé que interagia com as pessoas, que jogava bosta nas autoridades e que diziam que era louco por mulheres louras. Nós da Casseta resolvemos fazer uma jogada de marketing e gastar uma grana adotando o Tião. Era o patrocínio mais caro do Zoo, mas nós encaramos. Assim o macaco passou a ter uma placa com o logo da revista em sua jaula.
E então vieram as eleições para a prefeitura do Rio. Os candidatos não empolgavam ninguém e nós resolvemos lançar o Macaco Tião como candidato. Começamos a campanha na revista, era uma piada, é claro. Mas quando a piada é boa , ela pega e a “candidatura” do Tião começou a ficar falada.
Fomos ao Zoológico para lançar a candidatura do Macaco. Vários jornais foram cobrir o evento, que foi um sucesso. O macaco Tião parecia saber que era candidato, posava para fotos e em um determinado instante o Bussunda foi até um canto da jaula e o Tião se aproximou dele. Os dois pareciam até que trocavam algumas ideias. Bussunda então se declarou porta-voz do candidato e falou sobre as suas ideias. Os jornalistas anotaram tudo direitinho.
A campanha do Tião atingiu o seu ápice num show que promovemos para o candidato no Circo Voador. Vários artistas foram convidados, além de nós do Casseta & Planeta, que cantaríamos alguns das músicas do nosso show. O Circo Voador lotou naquela noite. Então, no meio do show um problema: Lobão, que seria a principal atração, ligou e disse que não ia. Tensão nos bastidores. Como é que íamos dizer para a multidão que a principal atração não iria? Então, alguém da produção descobriu que o Ultraje a Rigor estava na cidade. Conseguiram ligar para eles, que toparam participar do show. O show do Ultraje fechou o showmício que foi um sucesso.

Dizem que o Macaco Tião teve 400 mil votos naquela eleição, resultado que nunca foi comprovado porque o nome dele não estava na cédula. Mas como a votação ainda era em papel, muita gente escreveu Macaco Tião no seu voto. E não só no Rio de Janeiro. Com essa votação ele teria ficado em 3o lugar naquela eleição, ou seja, era a Terceira Via muitos anos antes. Dizem também, que o Macaco Tião entrou para o Guiness como o chipanzé mais votado na História.
NOVOS LIVROS DE AUTO-AJUDA
LEMBRANÇAS SEM SENTIDO
Toda vez que eu passo pela linha Vermelha, em direção ao túnel Rebouças, passo por um conjunto de prédios e sempre me lembro de um sujeito que serviu comigo no CPOR que no primeiro dia conversou comigo e disse que morava ali. Quase não falei mais com o cara no resto do ano e não lembro o nome dele. E sempre que passo por aqueles prédios e tenho essa lembrança eu me pergunto: Pra que lembrar desse fato que aconteceu há tanto tempo?
—–
Enquanto isso, lá dentro do meu cérebro…
– Ahn, até que enfim te encontrei!
– Quem é você?
– Eu sou o “neurônio fiscal das lembranças sem sentido”. Estou te procurando há anos!
– Mas o que que eu fiz?
– Nada. Exatamente por isso eu estou te procurando. Você está há mais de 40 anos guardando uma lembrança que não tem a menor importância. Ocupando espaço de memórias mais relevantes.
– Eu acho essa lembrança legal. Eu estou só cumprindo o meu papel, sou o neurônio que lembra que quando o Beto serviu o exército, ele conheceu um sujeito que morava naquele prédio.
– Mas o Beto nem ficou amigo do cara! Eles só conversaram no primeiro dia, depois mal se viram! Para que você está guardando isso?
– Ah, é legal lembrar dos tempos de CPOR.
– Legal nada! Ele não gostou de servir o exército. Perdeu um ano da faculdade!
– Então é bom lembrar que nem tudo é legal na vida e…
– Pode parar! Eu sei muito bem que você está aqui se escondendo há décadas, vivendo no bem bom, guardando essa lembrancinha sem sentido e gastando energia à toa! Pode esquecer isso. Trata de guardar outra lembrança! Vamos trabalhar!
– Tá, mas é que eu já estou apegado a essa lembrança…
– Não interessa! Esquece esse negócio! Ou lembra outra coisa, ou então eu vou te desligar!
—–
Ontem eu passei de novo na linha Vermelha e me lembrei de novo desse meu colega de CPOR. Acho que o “neurônio fiscal de lembranças sem sentido” não se lembrou de desligar o tal neurônio que guarda essa memória. Mas, pensando bem, fiscalização no Brasil nunca funcionou, não seria dentro do meu cérebro que iria funcionar!
MEMÓRIAS – AS CAMISSETAS
Em 1987, no sexto numero da revista Casseta Popular, resolvemos lançar umas camisetas engraçadas para vender. Chamamos de camissetas, as camisetas da Casseta. A empreitada começou tímida, lançamos apenas três estampas: “Liberdade, ainda que à tardinha”, “Vá ao teatro, mas não ne chame” e “Casseta Popular, eu leio e entendo”. As duas primeiras foram ideias minhas. O anúncio das camisetas ficava no verso da contracapa e ainda era em preto & branco. Curiosidade: custavam 340 cruzados, que não tenho a menor ideia de quanto seria hoje em dia.
As camisetas fizeram um certo sucesso, o que nos animou, tanto que na revista número 8, criamos mais algumas estampas, entre elas “Liberdade é passar a mão na bunda do guarda” e , principalmente uma que tinha uma bandeira do Brasil estilizada com os dizeres: “Ê povinho bunda”. Essa foi a campeã de vendagem por todo o tempo em que vendemos camisetas, nunca deixou de vender. Venderia ainda hoje, com certeza.

A cada número da revista a gente bolava novas estampas, duas ou três, e tirava as que vendiam menos. Algumas faziam muito sucesso e permaneciam no catálogo. Além da “Ê povinho bunda”, também ficaram “Punição ao chopp de colarinho branco” ou “Eu sobrevivi a um pé na bunda”, entre outras. O anúncio das camisetas passou a ocupar a contracapa da revista e a ser em cores. Com o tempo, as camisetas eram tantas que ocupavam a contracapa e o seu verso, ambas coloridas.
Foram mais de 50 estampas. Muitos amigos e amigas posaram como modelos para as camisetas. Durante a campanha do Macaco Tião, quando lançamos uma camiseta de apoio ao candidato, conseguimos um macaco para ser modelo.
Durante um tempo nos empolgamos e lançamos também calcinhas e cuecas com estampas engraçadas. Mas não fizeram muito sucesso. Quem é que vai usar uma cueca onde está escrito “Aposentado”?
Apesar do sucesso de vendas das camisetas, nunca fomos bom administradores e elas não nos renderam muita grana, mas acabavam ajudando a bancar a revista.
Um dia, eu estava na redação escrevendo um texto, quando entrou um sujeito que eu não conhecia na minha sala. “Oi, tudo bem?”, perguntei. O cara então disse quem era. Na verdade, ele não falou, só mostrou a sua arma. A redação estava sendo assaltada. Eram três caras que trancaram todo mundo que estava na redação naquele momento numa sala e fizeram a limpa. O que eles levaram? Camisetas, que era só o que havia de valor. Ninguém se machucou, foi mais o susto e o prejú. Nos dias seguintes soubemos que os moradores de uma favela na zona sul do Rio estavam todos andando com as nossas camisetas. Tremendo sucesso!
ESTÃO MATANDO OS HUMORISTAS – CAPÍTULO 1
ESSE É O PRIMEIRO CAPÍTULO DO MEU LIVRO “ESTÃO MATANDO OS HUMORISTAS”.
Foram doze horas de viagem de ônibus desde o interior do Espírito Santo até o Rio de Janeiro, trafegando pelas esburacadas estradas brasileiras. Milhares de quebra-molas depois, Armando ainda enfrentou duas horas de trânsito dentro de um ônibus lotado, cruzando a ainda mais esburacada Avenida Brasil, em pé, mal conseguindo se segurar na barra de ferro, até desembarcar no subúrbio onde ficaria hospedado. E então, quando achou que havia chegado ao seu destino, não conseguiu encontrar a casa de seu tio Ascânio. Será que havia anotado o endereço errado ou a casa do tio era mesmo aquela sem número na porta, tão maltratada que aparentava estar abandonada, com uma fachada tão cheia de pichações que parecia ter sido escolhida como painel de demonstração de uma fábrica de tintas em spray?
Armando tirou de suas costas a mochila, que a esta altura pesava algumas toneladas, e a depositou no chão. Vasculhou ao redor da porta em busca de uma campainha, mas não encontrou nenhum botão ou algo ao menos parecido. Resolveu usar o velho método de bater na porta. Deu três soquinhos, esperou um tempo, mas ninguém atendeu. Bateu mais uma vez com um pouco mais de força. Nada. Timidamente gritou o tradicional “ô de casa”, que repetiu mais alto duas ou três vezes. Numa última tentativa desesperada, Armando bateu forte com a mão espalmada e dessa vez escutou um grito vindo de dentro:
– Já vai, caralho!
Um rapaz com os cabelos desgrenhados abriu a porta.
– É o quê?
– Oi… Desculpa eu bater assim, mas é que ninguém estava ouvindo e…
– Tá. É o quê que você quer? Tá vendendo alguma coisa?
– Não… Você é o Valdecir, o filho do Ascânio?
– Sou.
– Eu sou o Armando Penteado… de João Neiva.
– Ah, de João Neiva – Valdecir pensou um pouco. – E João Neiva é quem?
– João Neiva é a cidade que eu moro, no Espírito Santo.
– Espera aí. Eu já ouvi falar nessa cidade. Acho que eu tenho família lá… Do jeito que você está falando aí, era para eu saber quem você é, certo?
– É… eu sou seu primo, Armando, filho do Praxedes.
– Você é filho do tio Praxedes? – Valdecir tentou segurar, mas não conseguiu, explodiu numa gargalhada. – Puta que pariu! Praxedes! Eu não consigo falar esse nome sem dar risada. Praxedes é bom pra caralho!
– É… é um nome um pouco diferente… – Armando concordou, meio sem jeito.
– Porra, põe diferente nisso! – Valdecir ainda ria. – É verdade, eu tenho mesmo um tio com esse nome escroto aí…
– Ascânio também não é um nome muito comum.
– Ascânio também é um nome escroto, mas esse eu já estou acostumado. Praxedes não! – Valdecir ainda soltou algumas golfadas de riso, até que conseguiu se controlar. – Diz aí, primo, o que é que você quer mesmo?
– É que eu vim estudar aqui no Rio e o meu pai combinou com o tio Ascânio que eu ia me hospedar aqui.
– Se você quer falar com o meu pai, chegou na hora errada. O velho não está em casa não.
– Puxa, mas ele não te avisou que eu vinha?
– Eu não estou sabendo de nada não. Meu pai nunca me avisa de porra nenhuma. Não é só o nome dele que é escroto não, ele também é.
Armando chocou-se com o comentário do primo sobre o pai, mas procurou não demonstrar reação. Os dois permaneceram calados por algum tempo, até que Armando quebrou o silêncio:
– Será que eu poderia entrar para esperar o seu pai chegar?
Valdecir não respondeu. Escancarou a porta e sumiu para dentro da casa, deixando Armando sozinho. Depois de esperar alguns minutos pela volta do primo, Armando concluiu que ele não voltaria e que a porta aberta era a resposta afirmativa à sua pergunta. Acanhado, entrou devagar na casa e fechou a porta atrás de si. Caminhou um pouco pela sala, observando a parca decoração, apenas um sofá, uma cômoda e uma televisão. Na parede um quadro pintado por uma criança, provavelmente uma lembrança da infância do primo, e duas flâmulas desbotadas do Flamengo. Armando ainda esperou em pé pela volta de Valdecir, mas diante da demora se sentou.
Por meia hora ainda acreditou que Valdecir voltaria para falar com ele, o que não aconteceu. Levantou-se e foi examinar mais de perto as bugigangas que decoravam a cômoda, o que não levou mais do que um minuto. Pensou em ligar a televisão, mas achou melhor não o fazer sem pedir permissão ao primo. Sentou-se de novo no sofá e depois de uns vinte minutos achou que deveria procurar Valdecir pelo interior da casa. Seguiu por um corredor não muito grande. Percebeu uma fresta de luz debaixo de uma porta e concluiu que o primo estava ali. Depois de bater sem obter resposta, resolveu abrir a porta devagar e viu Valdecir sentado diante do computador, assistindo a um vídeo. Na tela uma moça se rebolava e se esfregava num rapaz.
– Valdecir – Armando chamou, mas o primo não esboçou nenhuma reação. – Valdecir! – Falou mais alto e só então percebeu que não adiantava aumentar o volume de sua voz, o primo nunca o escutaria com os enormes fones que cobriam os seus ouvidos.
Cutucou devagar o ombro de Valdecir.
– Porra! – Valdecir assustou-se e quase caiu da cadeira. – Que susto do cacete que você deu!
– Desculpa. Eu não queria te assustar.
Mostrando má vontade, Valdecir afastou os fones de seus ouvidos e pausou o vídeo.
– O que você quer, Arnaldo?
– Armando. Você não sabe me dizer se o seu pai vai demorar?
– Não sei. Era isso que você queria saber?
– Você não tem nem ideia?
– Cara, o velho não tem horário certo não. O que foi? Tá ruim de esperar lá na sala? Olha, se você quiser pode ficar aqui vendo esse vídeo comigo. Olha só, essa peituda é sinistra.
– Não, obrigado. É que eu viajei a noite toda, estou cansado da viagem e…
– Tá cansado? Pode deitar aí na minha cama e dar uma cochilada. Mas não aconselho não, que eu não troco esse lençol há um tempão, está meio imundo.
– Valeu, primo, mas será que você não podia ir adiantando as coisas…
– Adiantando o quê?
– Será que você não podia me mostrar a casa e dizer onde fica o meu quarto?
Valdecir respirou fundo, coçou a cabeça, até que falou:
– Rapaz, eu até mostraria, mas é que agora eu estou ocupado.
– Ocupado? – Armando apontou para a tela.
– Muito ocupado.
– Ah, tá… Mas será que seria muito difícil para você dar uma paradinha nessa sua… nessa sua atividade e me mostrar rapidinho o quarto extra da casa?
– Quarto extra?
– É… O local onde o seu pai falou para o meu pai que eu poderia me hospedar. Desculpa, mas é que o tio Ascânio está demorando muito e…
– Já vi que se eu não fizer isso, você vai ficar aqui enchendo o meu saco, não é? – Valdecir pensou um pouco. – Tudo bem, eu não devia, mas vou te mostrar esse “quarto” – fez o gesto das aspas com os dedos.
Levantou-se e seguiu pelo corredor da casa em direção a sala. Armando foi atrás. Entraram na cozinha e continuaram andando até a área de serviço, onde Valdecir apontou para uma porta fechada.
– Só pode ser ali. Não tem nenhum outro quarto vago aqui em casa, só esse. Era para ser um quarto de empregada, mas nós nunca tivemos uma, então está vazio… Agora dá licença que eu vou voltar pra peituda.
Valdecir partiu de volta para os seus afazeres, mas parou ao ouvir o grito de Armando.
– Ei, primo!
– O que foi agora? Não gostou das acomodações?
– Olha, eu não tenho nenhum problema em ficar nesse quartinho, mas você disse que estava vazio e está cheio de tralhas aqui. O que eu faço?
– É só tirar as tralhas e pronto.
– Será que eu posso mesmo tirar essas coisas daqui? Seu pai não vai achar ruim? E onde é que eu coloco?
– Caraca! Me responde uma coisa: você é jornalista?
– Não. Por quê?
– Porque desde que chegou você fez um monte de perguntas. Você é o Valdecir? Cadê o seu pai? Ele vai demorar? Qual é o meu quarto? O que eu faço com as tralhas? Seu pai não acha ruim? Tá me entrevistando, ô Pedro Bial?
– Não. Eu só queria saber onde é que eu posso colocar essas coisas todas que estão aqui no quarto. Mas deixa pra lá. Eu espero o meu tio chegar…
– Não espera não que você vai cansar. Faz o seguinte: bota essas tralhas lá na garagem. A gente não tem carro mesmo.
Armando agradeceu a informação e concluiu que valia a pena começar a limpar o quarto. Quando o tio chegasse ele explicaria que se adiantara e certamente não haveria problema.
O lugar tinha todo tipo de porcaria: livros empoeirados, roupas velhas, panos nojentos, cobertores furados, caixas vazias de aparelhos eletrônicos, revistas antigas, exemplares de todos os tipos de objetos que não se joga fora por algum motivo que não se lembra mais.
Armando pegou uma primeira amostra de cacarecos que havia em sua nova habitação e os levou até a garagem, onde descobriu uma quantidade ainda maior de tralhas. Ali, no entanto, os objetos eram de tamanhos maiores: uma geladeira velha e enferrujada, um sofá perneta, uma poltrona rasgada, uma bicicleta sem selim e sem uma roda; a garagem era uma espécie de lixão particular.
Armando logo percebeu que Valdecir permanecia por perto, a meia distância, observando o seu trabalho de pegar os objetos e carregar até a garagem.
– Você não estava ocupado? – Armando perguntou.
– Estava, mas não estou mais. Me diz uma coisa: Qual é mesmo o nome lá da sua cidade? – Valdecir perguntou.
– João Neiva.
– Ah… é isso. Eu sempre soube que tinha família lá, mas não conheço João Neiva não. Até conheço um João e uma Neiva, os dois são aqui do bairro. O João é um babaca que mora aqui perto e a Neiva mora na rua de trás. Aliás, a Neiva bate um bolão, mas vou te dizer uma parada… acho que ela é sapata.
Armando riu e continuou o seu trabalho. O primo continuou falando:
– Uma pena a Neiva gostar de mulher, porque ela é muito gata. – Valdecir parou de falar e ficou pensando. – Você é meu primo mesmo?
– Claro que sou. Já te disse.
– Será? Você chegou aqui, disse que era meu primo e eu acreditei. Mas vai que você é um ladrão assassino que entrou aqui pra me dar um golpe? Vai que você entrou aqui pra roubar minhas paradas e me sequestrar?
– Fica tranquilo que eu não sou ladrão nem sequestrador não. Aliás, eu jogo justamente no time adversário. Lá em João Neiva eu era da polícia.
– Polícia? – Valdecir arregalou os olhos.
– Ué, ficou nervoso por quê? – Armando riu com a reação do primo. – Você está devendo alguma coisa para polícia, Valdecir?
– Não, não! – Valdecir apressou-se em responder.
– Fica calmo, eu não sou mais policial. Fui só por um tempo, mas saí justamente porque eu queria vir para cá, estudar, fazer faculdade. – Armando pegou uma pilha de revistas para levar até a garagem. Valdecir seguiu atrás.
– Você veio para cá para fazer faculdade de quê?
– Direito.
– Você quer ser advogado?
– É… O meu avô era delegado, o meu pai é delegado… E para ser delegado tem que ser formado em direito.
– Então você quer ser delegado que nem seu pai?
– Não sei. Acho que sim, mas… – Armando voltou até o quarto, pegou outra pilha de revistas e seguiu de novo até a garagem.
– Mas o quê? Você não quer ser policial?
– É, acho que não vai me restar outra alternativa, a minha família sempre foi da polícia, a pressão lá em casa é grande.
– Mas pelo que eu estou entendendo, se você pudesse, faria outra coisa.
– É, se eu pudesse, faria.
– Faria o quê?
– Ah, não sei. Deixa pra lá…
– Fala aí! Que parada é essa que você queria fazer? Você vai negar uma informação para o seu primo, primão?
Armando parou o que estava fazendo e ficou olhando para Valdecir, avaliando se deveria responder.
– Não, acho melhor não falar…
– Pô, você chegou aqui do nada, disse que é meu primo e eu acreditei. Você está dizendo aí que meu pai te ofereceu esse quartinho aí e eu acreditei. Até te mostrei o quarto. Confiei em você. Agora você não confia em mim?
– Confio. Claro que eu confio – Armando respondeu meio sem jeito.
– Então, qual é o problema de dizer o que é que você gostaria de ser se não tivesse que ser delegado?
– Para que você quer saber?
– Sei lá. Tô curioso.
– Eu vim pra cá pra estudar direito mesmo.
– Aposto que você queria estudar uma parada dessas de humanas, tipo história, sociologia, essas paradas de esquerdista.
– Não, nada a ver.
– Já sei! Gastronomia. Tá na moda, com esses programas tipo Master Chef e coisa e tal.
– Não, eu nem sei cozinhar direito.
– Pô, diz aí. Que segredinho é esse?
– Não tem segredo nenhum, mas é que é só um sonho. Uma bobeira.
– Pô, que mistério, meu irmão! Diz aí, cara!
– Tá, eu vou dizer. Não é sério, é só uma fantasia, entende? É que eu gosto muito de humor, de comédia…
– Você quer ser comediante?
– É… – Armando respondeu baixinho e escutou seu primo explodir numa gargalhada.
– Caraca ! Esporrante! Demais! Você, com essa cara séria quer ser comediante? Tá de sacanagem? – Valdecir falava entre risadas. – Quer saber? Você deve ser bom mesmo, porque há um tempão eu não ria tanto. Primeiro lá na porta com o nome do seu pai, e agora com essa piada aí…
Armando arrependeu-se imediatamente de ter falado sobre o seu sonho ao primo.
– Eu já fiz alguns shows de stand up lá em João Neiva, sabia?
– Claro! Quem vai dizer que não gostou do show do filho do delegado? – Valdecir continuava rindo.
Armando não respondeu, respirou fundo e se concentrou na limpeza de seu novo quarto.
Valdecir saiu da área, rindo bastante e seguiu para dentro da casa, mas logo voltou trazendo um banquinho para se sentar. Ficou ali calado, acompanhando o trabalho de Armando. Mas o seu silêncio não durou muito:
– Qual é o seu estilo de humor?
Armando fingiu que não escutou a pergunta, mas Valdecir repetiu.
– Diz aí, qual é o seu estilo de humor?
– Você faz muita pergunta, rapaz! Você é jornalista?
– Essa piada do jornalista eu já fiz. Você é comediante tipo ladrão de piada, é?
– Não, eu não roubo piada de ninguém.
– Claro que rouba. Todo humorista rouba piada. Estou cansado de ver no twitter a galera reclamando: “ah, essa piada era minha e fulano tá dizendo que é dele”.
Armando não falou nada. Pegou alguns livros um pouco mais pesados e os levou para a garagem. Quando voltou, o primo continuou:
– Você quer mesmo ser comediante? Difícil de acreditar, sabia? Faz um número maneiro aí para mim. Para eu ver se você é bom mesmo.
Armando não deu trela para o primo, mas na terceira vez que Valdecir lhe pediu, ele acabou respondendo:
– Agora não dá. Você não está vendo que eu estou ocupado?
– Faz aí cara, faz! Para um instantinho e conta uma piada aí.
– Eu não vou contar piada nenhuma – Armando falou, irritado.
– Você é muito nervosinho, hein! Mas, pensando bem, tem uns humoristas irritadinhos que ficam no palco dando ataque de pelanca e é engraçado, sabia?
– Posso te pedir uma coisa? Vai lá pro seu quarto ver as suas peitudas, vai…
– Caraca, mal chegou e o cara já tá se sentindo em casa, já tá até me dando ordem.
Armando se arrependeu imediatamente de tratar com rispidez o primo que acabara de conhecer.
– Desculpa, Valdecir, foi mal.
– Não, não, tudo certo. Eu vou lá para o meu quarto mesmo, até porque o meu pai deve estar chegando e eu não quero cruzar com ele.
Valdecir levantou-se, pegou o banquinho e partiu de volta para o seu quarto, mas no meio do caminho, lembrou-se de algo e voltou.
– Aí, primo. Você leva o maior jeito nessa parada de arrumar quarto, sabia? Podia trabalhar com isso em vez de ser humorista. Aí, se der, depois que acabar de arrumar o teu quarto aí, passa lá no meu para dar uma arrumada lá também. Aquilo está uma zona do cacete!
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OLIMPÍADAS – POR UM NOVO QUADRO DE MEDALHAS
As Olimpíadas de Tóquio estão chegando e a gente já está começando a pensar nisso. Eu adoro Olimpíadas, mas tem uma coisa que eu não acho legal: a contagem das medalhas ganhas por cada país. O quadro de medalhas é muito injusto. Eu acho uma sacanagem um time de vôlei jogar um monte de jogos duríssimos e só ganhar uma medalha, enquanto a natação dá trocentas medalhas: pro cara que nada 50, 100 metros, 200 metros, de frente, de costas, de cachorrinho, imitando foca… E a ginástica olímpica? É solo, trave, trave assimétrica, trave direita, trave esquerda, travessão, argola, furico… Nada contra esses atletas, todos merecem medalhas, o problema é o quadro de medalhas.
Por isso eu estou propondo uma nova maneira de contabilizar as medalhas olímpicas. Uma forma que acho que é muito mais justa.
Os atletas continuariam a ganhar as suas medalhas na modalidades que disputam, mas o quadro de medalhas por país mudaria. Os esportes passariam a ser agrupados por tipos e teríamos o país vencedor de cada tipo de esporte. No final o país que ganhasse em mais grupos seria o vencedor das olimpíadas.
A minha proposta de grupos é a seguinte:
ESPORTES DE CORRER – 100,200,400 e etc metros rasos ou com barreiras.
ESPORTES DE PULAR- salto em altura, distância, triplo…
ESPORTE DE GENTE PARRUDA – levantamento de peso, lançamento de martelo…
ESPORTE QUE MOLHAM – todas as provas de piscina.
ESPORTES COM BOLA – futebol, vôlei, vôlei de praia, basquete, handebol…
ESPORTES COM ALGUMA COISA NA MÃO – tênis, tênis de mesa, remo…
ESPORTES DE DAR NOTA – ginástica olímpica, saltos ornamentais…
ESPORTES DE LUTA- Judô, tae-kwon-dô, boxe, luta livre, luta Greco-romana…
ESPORTES ARMADOS – tiro , tiro com arco…
ESPORTES EM CIMA DE ALGUMA COISA – hipismo, ciclismo, vela…
ESPORTES QUE NÃO SÃO MUITO BEM ESPORTES – badminton, ginástica rítmica, nado sincronizado…
O Brasil ia se dar bem em esportes com bola e talvez nas lutas (se o MMA virasse esporte olímpico então, arrebentava).
Então, o que vocês acham?
MEMÓRIAS: ESCREVENDO PARA O TV PIRATA
Começamos a escrever para o TV Pirata animados. Eu, Helio, Bussunda e Claudio formávamos um grupo de redatores. A nossa cota de textos semanais para mandar não era fixa, mas como éramos um grupo, mandávamos muitos roteiros. E um percentual bem alto do que a gente enviava para a redação final acabava entrando no programa. O Madureira escrevia com o Reinaldo e o Hubert.
Naquele tempo, idade das trevas da informática, ainda escrevíamos a mão, num bloco pautado. Então dávamos o texto pronto para uma secretária que trabalhava para a gente e ela datilografava. Tanto as máquinas de escrever como o verbo datilografar não são mais usados. Na redação final, o Claudio Paiva fazia um cut-paste mezozóico, que era cortar com tesoura o pedaço do texto a se utilizar e colar num papel, junto com as modificações que ele queria fazer no texto. O texto final normalmente era uma enorme tripa de papéis colados, que era novamente datilografado e enviado para a produção. Não lembro quando começamos a escrever em computador, imprimir os textos e mandar pela Internet.
Escrevemos vários quadros que fizeram sucesso, como TV Macho, As Presidiárias, muitas paródias de propagandas, Piada em debate (que era um quadro do nosso show que adaptamos para o programa). Me lembro que um dia, logo no início, o Claudio Paiva nos ligou e pediu para escrevermos quadros com personagens femininos, porque as atrizes estavam com menos papéis que os atores. Fomos para a nossa reunião com essa encomenda. Começamos a pensar em algum quadro, repetindo na cabeça o mantra: “precisamos de papéis femininos, precisamos de papéis femininos…”. Resultado: Saiu o quadro TV Macho, que era um quadro que sacaneava os machos, mas não tinha muitos papéis femininos. Não foi de sacanagem, mas acabou rolando. Como o quadro era bem engraçado, nós mandamos e fomos bastante sacaneados pelo Claudio Paiva. Mas pelo menos criamos um quadro que fez bastante sucesso. E para nossa defesa, havia um papel feminino que a Regina Casé fez, que ficou muito legal. Era uma torcedora do Botafogo, presidente da torcida Violência alvi-negra. Muito engraçado!
Depois nos redimimos e criamos um quadro para as atrizes: As presidiárias. Nesse quadro a Claudia Raia fazia uma presidiária lésbica, papel que ela adorou, pois só fazia mulheres lindas e maravilhosas. Ela adorou a personagem. Também fez muito sucesso. A novela “Fogo no rabo” (“Barbosaaaa”) era da galera do Planeta.
Escrevemos os primeiros textos do TV Pirata na nossa sede na Praça Onze. Agora ninguém mais vinha da praia, todo mundo chegava lá cedo para trabalhar. Tinhamos que fazer a nossa cota semanal para o TV Pirata e ainda escrever a revista Casseta Popular, que continuava sendo lançada todos os meses nas bancas de jornal.
Algum tempo depois, acho que no segundo ano de TV Pirata, alugamos uma sala na zona sul, em Botafogo, onde montamos a nossa redação. A sede da revista e das camisetas ainda continuou na Praça Onze.
QUER EMAGRECER? PERGUNTE-ME COMO.
MAL SÚBITO
A cena do Eriksen, jogador dinamarquês, caindo em campo e recebendo massagem cardíaca com todo mundo assistindo foi muito chocante. Graças a Deus ele saiu vivo dali e perece que está bem.
Mas o que aconteceu com o Eriksen para ele desabar daquele jeito? Até agora a explicação foi que ele teve um mal súbito.
Mal súbito é uma explicação que sempre me intrigou. Não parece ser uma doença, soa mais como se o médico tivesse desistido de descobrir o que aconteceu e pra dizer alguma coisa mandasse o tal do “mal súbito”. Seria a mesma coisa de dizer que o sujeito caiu duro de… “Não sei o que”. O que ele teve? Não temos a menor ideia. Aconteceu uma parada estranha pra caramba e ele babau! Quer dizer: Mal súbito.
Mas será que, assim como existe o mal súbito, existe também o bem súbito? O cara está com o coração todo entupido e, de repente, acontece um bem súbito que limpa suas artérias! O cara não tem talento para nada, de repente sofre um bem súbito e ele sai tocando violão e compondo sucessos incríveis! O cara é um presidente negacionista, que gosta de cloroquina e de botar fogo em floresta, de repente, do nada, ele tem um bem súbito e … Não, é melhor não contar com isso.