A máscara no queixo é uma instituição que a pandemia consagrou no Brasil. O sujeito sai de casa com a máscara porque é obrigado a isso, mas enquanto ninguém reclama, nenhum fiscal aparece ou um chato qualquer vem pedir para ele colocar a máscara sobre o nariz e a boca, ele a deixa lá no queixo. E por que ele deixa no queixo e não a coloca no bolso? Porque o cara é esperto e avalia que com a máscara no queixo fica mais fácil de suspendê-la rapidamente quando alguma autoridade, fiscal ou chato aparecer. “Calma, eu estou de máscara!”, ele se defende. A ideia de que se usa máscara para se proteger e proteger os outros não tem a menor importância.
Pois eu sou um destes chatos que pede para puxar a máscara do queixo para cima! A pandemia me transformou no chato da máscara. Eu reclamo mesmo! E aguento a cara feia.
Sou o chato que grita para os sem máscara colocarem máscara.
Sou o chato que pede mais vacina.
Sou o chato que quer lockdown.
Sou o chato que não deixa ninguém mais entrar no elevador comigo.
Sou o chato que odeia aglomeração.
Sou o chato do álcool gel.
Sou o chato que discute com negacionistas.
Sou o chato que reclamava do Pesadello e reclama do novo ministro de continuidade.
Sou o chato que acha o que o presidente é um genocida e pequi roído.
Sou o chato que acha que todo mundo devia ser mais chato porque mais chata é essa porra dessa pandemia!
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PALPITERAPIA
Além de um dos países que tratou da pior forma a epidemia de coronavirus, o Brasil também virou o berço de uma nova especialidade médica. Essa nova ciência, comandada pelo presidente do país, se desenvolveu de maneira espetacular no Brasil. Trata-se de uma nova forma de tratamento de covid que ficou conhecida como Palpiterapia. O palpiterapeuta não precisa ter diploma de medicina, enfermagem, biologia ou qualquer outro diploma de qualquer área, basta ter vontade e gosto por dar palpites. O método terapêutico recomendado pela Palpiterapia é bem simples. A ideia é que vários Palpiterapeutas se juntem em volta do paciente, e comecem a dar os seus palpites:
– Ih, isso aí é só uma gripinha.
– Gripinha? Não, isso deve ser covid, mas o cara tem histórico de atleta.
– Dá cloroquina que resolve!
– Cloroquina e Invermectina !
– Azitromicina!
– Annita também é bom!
– A cantora? A música dela cura covid?
– Não, o que cura é uma tatuagem no rabo.
– Alguém aqui sabe fazer tatuagem no rabo?
– Não!
– Então dá cloroquina!
– Não, é melhor não tomar remédio, tem muita química e faz mal. Toma um chá.
– Chá de quê?
– Chá de extrato de cloroquina.
– Não, dá esse remédio homeopático pra ele que isso que cura tudo.
– Não! Dá esse floral que é ótimo!
As experiências já realizadas pelos palpiterapeutas do Brasil todo têm apresentado um resultado bastante parecido: Dez entre dez pacientes levantam rapidinho da cama e começam a gritar:
– Pelo amor de Deus! Para com isso! Me dá uma vacina! Eu quero é vacina!
UM PROJETO SOCIAL
REPÓRTER – Estamos aqui para acompanhar mais um belo projeto social, um esforço de solidariedade que vem sendo desenvolvido aqui pelo seu Nestor. Seu Nestor, explica o que é que vocês estão fazendo aqui, por favor.
SEU NESTOR – Pois é, a gente estava vendo que existia uma quantidade enorme de comprimidos de cloroquina estocados sem uso, já que eles não servem para tratamento de Covid.
REPORTER – Mas eles não servem para quem tem malária?
SEU NESTOR – Sim, mas o governo comprou uma quantidade tão grande desse remédio que mesmo que o Brasil vire um enorme lamaçal não vai ter tanta gente com malária para usar esses comprimidos todos.
REPORTER- É verdade, é muita coisa mesmo. São milhões de comprimidos. E qual foi a ideia de vocês para usar esse estoque todo?
SEU NESTOR – Então, nós criamos esse projeto que tem o objetivo de dar um uso para todos esses comprimidos de cloroquina. A ideia é que artistas amadores usem os comprimidos de cloroquina como matéria prima para fazer artesanato.
REPORTER – Que interessante! Mas vamos ver os produtos que as pessoas estão produzindo aqui. Você pode mostrar pra gente, Seu Nestor?
SEU NESTOR – Claro. Essa aqui é a dona Hermengarda. Ela está colando comprimido a comprimido nesse casaquinho que ela fez e assim vai fazer um casaquinho todo de cloroquina.
REPORTER- Nossa, que bonito!
SEU NESTOR – Esse aqui é o seu Antônio. Ele pintou os comprimidos de diversas cores para poder produzir esse quadro…
REPORTER- Que bela paisagem, seu Antônio! Parabéns!
SEU NESTOR – Tem vários outros trabalhos de arte por aqui, um mais bonito que o outro, todos usando os comprimidos de cloroquina. Tem um senhor criando um mosaico de cloroquina numa parede, uma moça que está fazendo um abajur todo de cloroquina, vários cinzeiros, potes e jarros de cloroquina. Tem muita coisa bonita.
REPORTER – Que espetáculo. E vocês pretendem vender esses produtos?
SEU NESTOR – Sim. Nós vamos realizar uma grande feira, A FECLORO, A Feira de Produtos de Cloroquina, para expor e vender os produtos.
REPORTER – Muito boa ideia! E o dinheiro arrecadado nessa feira, vai ficar com as pessoas que trabalham no projeto?
SEU NESTOR – Uma parte vai ficar com eles, mas a maior parte do dinheiro nós vamos usar para o que importa: comprar vacinas contra Covid!
ENTREVISTA COM O ZÉ GOTINHA
Repórter- Bom dia , Zé Gotinha. E aí, animado com a vacinação?
Zé Gotinha – E estou super animado com a vacinação, o que está me deixando chateado é que ninguém me chamou ainda pra fazer campanha pela vacinação, pô! Só me chamam pra cerimônias oficiais!
Reporter- Mas você tem aparecido a beça na mídia. Há um tempão a gente não via você tanto.
Zé Gotinha- Você já me viu em alguma propaganda? Não! Já viu alguma campanha do governo para o povo se vacinar? Não! Até agora só me chamaram para posar ao lado de políticos. Pô, eu não votei em ninguém, é sacanagem ficar me usando para fazer campanha política, essa vacina nem é em gotas! Se é pra fazer proselitismo leva uma seringona ! Leva o Zé Seringa para os eventos políticos!
Reporter- Mas você não acha essas cerimônias importantes?
Zé Gotinha – Você já viu as fotos das cerimônias? Quase sempre o único que está de máscara ali sou eu! O ministro da saúde não usa máscara, o presidente não usa máscara… Outro dia o presidente quis até me cumprimentar! Fala sério! E nem álcool gel me dão nas cerimônias, eu tenho que levar o meu!
Repórter – Você tem medo de se contaminar?
Zé Gotinha – Claro! Ainda não ficou provado que os Zé gotinhas podem ou não pegar covid! E se eu pegar ? Quem é que vai acreditar num Zé Gotinha que já pegou covid?
Repórter – Você quer ser vacinado?
Zé Gotinha- Quero! Estão me mandando para um monte de cerimônias de vacinação sem distanciamento, ninguém de máscara, aglomeração para caramba! Isso é muito arriscado. Eu tinha que estar no grupo prioritário de vacinação!
A LÓGICA DA LOGÍSTICA
Um generalista é aquele sujeito que sabe pouco sobre muitos assuntos. O especialista é o que sabe muito sobre um assunto. Apesar do nome, nem todo general é um generalista. O ministro Eduardo Pesadello, por exemplo, é general e se diz especialista em logística. Até agora provou que a sua única especialidade é ser especialista em se dizer especialista em logística. Pesadello parece mais ser um generalista, mas um generalista diferente, ele não sabe nada sobre quase tudo.
Logística é uma palavra que parece com loja. Talvez o nosso ministro seja um especialista em lojística, com j, e acha que comprar uma vacina é muito fácil, é só entrar numa loja e escolher a vacina que quer comprar.
O problema é que a única loja de vacina que está aberta fica na China.
Logística é uma palavra que tem a ver com lógica.
Longe também é uma palavra que parece com lógica.
A China é um país que fica muito longe do Brasil, então pela lógica de nosso presidente e de seu ministro do exterior, eles podem falar mal da China, porque a China é longe e é lógico que os chineses não vão ficar sabendo. No entanto, a China é longe, mas entende mais de lógica que o nosso presidente. E, pela lógica da China, não faz muito sentido que ela seja a maior compradora de produtos brasileiros e seja sacaneada pelo presidente do Brasil e seus asseclas. E a China sabe que a logística da vacina no Brasil depende dela. Então, pela lógica, a China resolveu fechar a sua loja e não mandar os insumos da vacina para o Brasil.
E então o nosso general especialista em lojística vai na loja de vacinas e bate de cara na porta fechada. E é lógico que o Brasil fica sem vacinas.
ENTREVISTA COM UM NEGACIONISTA
Depois do início da vacinação, entrevistamos um médico negacionista para entender o que vai acontecer agora que o país começa a ser vacinado.
Doutor, como medir os efeitos da vacina?
O ideal é que se faça um acompanhamento das pessoas vacinadas para se monitorar a quantidade de jacarés que vão surgir depois do inicio da vacinação. Quanto mais jacarés, maior o sucesso.
Assim que é vacinada, a pessoa já está imunizada?
Não, é preciso esperar umas duas semanas. Mas depois de uma semana, ela já vai sentir o efeito, a pele vai ficando verde, vai enrugando e as pernas e braços vão diminuindo.
Se a pessoa virar jacaré, o que ela pode fazer para voltar ao normal?
Ainda não sabe ao certo, é uma experiência muita nova, mas preconizamos o tratamento precoce com cloroquina. Só não sabemos se o jacaré com aquele bocão vai conseguir engolir a cloroquina.
As vacinas que serão ministradas no Brasil podem causar algum outro efeito colateral?
A vacina chinesa pode fazer com que a pessoa só queira comer com palitinho, o que vai dificultar muito o brasileiro que gosta de comer churrasco. Já a outra vacina, a inglesa, pode dar uma vontade danada de dirigir pelo lado esquerdo das estradas, o que pode causar muitos acidentes.
Quando alcançaremos a imunização de rebanho?
No caso do gado bolsonarista, que já são rebanho, só falta a imunidade.
AGLOMERAÇÃO GERA AGLOMERAÇÃO
DIA D, HORA H – A REVOLTA DAS LETRAS
Então, sem saber o que dizer, o ministro da Saúde Eduardo Pesadello falou que a vacinação iniciaria no dia D, na hora H.
O X logo reclamou. Se era para a data ser uma incógnita, esse papel deveria ser dele, que sempre foi a letra das incógnitas, é só perguntar aos matemáticos. Portanto, a vacinação deveria ser no dia X!
O Y ficou chateado. Afinal, o Y também era uma incógnita famosa, sempre fez dupla com o X. Então foi feito um acordo e decidiu-se que a vacinação seria no dia X, na hora Y.
O ponto G apareceu para dizer que a população estava muito excitada com a divulgação da data de vacinação, portanto cabia a ele, que sempre causara muito excitação, essa função. A vacinação deveria ser no ponto G.
O A ficou muito irritado! Ele sempre iniciou tudo, inclusive o alfabeto! Se era para iniciar, tinha que ser no dia A!
Aí o 1 ficou puto! E por que usar letras e não números? Letras foram feitas para palavras, contagens merecem números. Toda contagem começa no 1, pô! A vacinação deveria começar no dia 1, na hora 1!
Aí o alfabeto todo enlouqueceu! Foi um tal de mandar pra PQP, dizer que aquela discussão era uma M, mandaram até tomar no C…
Então a discussão acabou quando chegou o ponto de interrogação e convenceu a todos que o lugar era dele: A vacinação começaria no dia ? , na hora ?
MELHORES DO ANO DO CORONA VÍRUS
Poucos souberam, porque a imprensa não noticiou, mas a cerimônia do Prêmio Internacional de Melhores do Ano do Corona Vírus aconteceu na semana passada. A festa foi realizada no Brasil, dentro do corpo de uma autoridade e contou com a presença de milhões de coronavírus representando todos os países do mundo. Antes da entrega dos prêmios, os convidados assistiram a um show musical estrelado por alguns coronavírus que já infectaram estrelas internacionais da música. O show foi um sucesso, aplaudido de pé pela plateia e logo em seguida, a premiação começou. O clima era de tensão nessa festa que foi considerada o Oscar do coronavírus. E os premiados foram os seguintes:
Prêmio Sem máscara é melhor – Donald Trump
Prêmio E daí, eu não sou coveiro – Jair Bolsonaro.
Prêmio Aglomeração de Final de ano – Neymar.
Prêmio Pra que tanto estresse? – Eduardo Pazzuello .
Depois da entrega dos prêmios, os coronavírus se divertiram com uma grande festa, regada a muito vinho e champagne. O ponto alto aconteceu quando um corona gaiato distribuiu fartas doses de cloroquina, o que proporcionou muitas risadas nos convidados da festa.
HÁ UM ANO
No final do ano de 2019 eu tinha alguns medos.
Tinha medo que o Trump desse um ataque de pelanca e resolvesse apertar o botão vermelho para ver o que acontecia.
Temia que o Kim Jon Un desse a louca e resolvesse mandar uma bomba atômica para ver o que acontecia.
Ou que fosse o Irã que desse a louca e mostrasse ao mundo que tinha bomba atômica e não tinha medo de usá-la.
Tinha medo até de vírus. Mas de vírus de computador. Medo que um ciber-maluco jogasse um monte de vírus nos computadores do mundo e a gente ficasse sem internet pra sempre.
Tinha medo até que os alienígenas resolvessem atacar a Terra. Sempre achei que isso pudesse acontecer.
Mas eu nunca tinha pensado que um vírus pudesse nos fuder. Vírus, tipo vírus mesmo, esses bichinhos que causam virose.
Juro que nunca tinha pensado nessa hipótese.
Pois não é que apareceu o tal do coronavírus e o mundo virou de cabeça pra baixo. Parou tudo.
E logo aprendemos um monte de palavras novas: além de corona vírus, teve também covid-19, Cloroquina, Hidroxicloroquina, Invermectina, Astrazenica, Coronavac… Há um ano nós nunca tínhamos escutado essas palavras e nem sabíamos como se pronunciavam.
Protocolo era só aquele número enorme que a gente fingia que anotava quando fazia uma reclamação por telefone. Em 2020 , tudo passou a ter protocolo e a gente incorporou a palavra.
Máscara no queixo era uma expressão que não fazia o menor sentido. É claro que sempre falamos de máscara e de queixo, mas as duas palavras juntas, só em 2020.
Distanciamento social. Até 2020 quem queria distanciamento era antissocial. Em 2020 , quem aglomerava é que era antissocial.
Pois é, há um ano eu fiz planos para 2020. Todo mundo fez. Nunca erramos tão feio!
Agora, no final de ano, véspera de 2021, nem pensar em fazer planos, nada de prognósticos, nada de profecias. É melhor ficar quietinho.